A frase a que alude o título foi proferida por Rúben Amorim quando chegou ao Sporting, um treinador jovem, ambicioso, astuto, mestre da tática e doutor da comunicação. Este artigo é sobre alguém que é a antítese de todos estes predicados: António José Seguro.
À hora que escrevo existem 16 candidatos assumidos à Presidência da República: André Pestana, Ângela Maryah, António Filipe, António José Seguro, Aristides Teixeira, Bruno Morgado, Henrique Gouveia e Melo, Joana Amaral Dias, João Cotrim de Figueiredo, Luís Marques Mendes, Manuela Magno, Orlando Cruz, Pedro Tinoco de Faria, Raúl Perestrello, Tim Vieira e Vitorino Silva.
Falta ainda o candidato do Chega, registando-se a intenção de Isidro Morais Pereira e ventila-se a possibilidade da candidatura de Rui Moreira.
Face a esta quermesse de candidatos, a possibilidade de sair na rifa uma segunda volta é praticamente uma certeza e, nesse contexto, com tantos candidatos à direita a fixar eleitorado, António José Seguro vê aumentarem de dia para dia as probabilidades de ser ele o desafiador do Almirante (ou outro…) nessa etapa.
A última má notícia para Marques Mendes foi o avanço de Cotrim Figueiredo, havendo agora, à direita, um candidato para cada espaço político mais Gouveia e Melo a pairar sobre todos eles e a captar o eleitorado que não gosta de nenhum dos “seus” candidatos.
Já à esquerda há António Filipe com capacidade de fixar a esquerda à esquerda do PS, que é bastante exígua, especialmente se se excluírem os eleitores do Livre – não faz muito sentido que quem em legislativas vota num partido liberal, europeísta e pró-Ucrânia vá agora votar no candidato do PCP.
António José Seguro tem um campo de jogo maior do que aqueles em que jogava o Tsubasa, que vai dos socialistas que queriam Sampaio da Nóvoa, aos sociais-democratas que queriam Vitorino, passando pelos ecologistas que queriam Rui Tavares e pelos sociais liberais que queriam Centeno. António José Seguro é o candidato do PS autárquico e isso não é despiciendo, já que o único sítio onde o PS continua a ser maioritário é no poder autárquico, mas, como se sabe, está muito longe de fazer o pleno no partido onde foi secretário-geral.
Seguro tem, por isso, como maior obstáculo a capacidade de mobilizar o eleitorado natural do centro-esquerda, mas com uma dispersão tão grande de candidatos, quaisquer 18% podem ser suficientes para passar à segunda volta.
Nessa fase, Seguro pode tornar-se mesmo o favorito, beneficiando, à esquerda, do voto por rejeição porque entre ele e qualquer candidato da direita – e aqui inclui-se Gouveia e Melo, mesmo contra a sua vontade – até os comunistas (e muitos socialistas) se lembrarão do conselho de Cunhal e taparão a cara de Seguro com uma mão, votando com a outra. À direita goza de uma significativa dose de voto por simpatia porque é um candidato que funciona à direita como Marcelo funcionou à esquerda.
E quando me refiro à capacidade de penetração à direita, não é só no centro-direita. Muitos eleitores do Chega não se sentirão desconfortáveis a votar no homem que afrontou sozinho o Socratismo e acabou defenestrado por António Costa. É difícil ser mais guerreiro antissistema que isto!
Numa perspetiva de segunda volta é até mais conveniente para Seguro o confronto com o ex-Almirante do que com Marques Mendes. A estratégia de rejeitar o apoio dos partidos penaliza Gouveia e Melo numa disputa mais polarizada entre dois candidatos. Mesmo que o Chega e a Iniciativa Liberal acabem a apoiar o militar, para o PSD vai ser complicado fazê-lo institucionalmente depois de Marques Mendes passar uma campanha inteira a apostar na estratégia de descredibilizar as capacidades do Almirante para ser Chefe de Estado (e bem, já que do ponto de vista programático sobrarão poucas diferenças).
Num cenário de segunda volta entre Marques Mendes e António José Seguro, a polarização será mais clássica entre esquerda e direita, mas, depois de ver tão proeminentes figuras do presente e do passado do PSD, como Rui Rio, Carlos Carreiras e Isaltino Morais a apoiar outro candidato que não Marques Mendes e de ver a hesitação da direção do PS em apoiar Seguro, o candidato menos ideológico acabará por ter maior sucesso.
Numa eleição que há oito meses muitos vaticinaram que seria um passeio no parque para Henrique Gouveia e Melo, chegamos a setembro com vários cenários em aberto.
Marques Mendes é alguém que não entusiasma, mas não deixa de ser uma velha raposa da política, capaz de fazer uma campanha sólida e eficaz.
António José Seguro partiu de uma posição muito difícil, aproveitando um refluxo reflexivo (mais um) de Pedro Nuno Santos para se posicionar contra a vontade do próprio partido. Teve, até agora, tudo contra si, mas decidiu seguir o exemplo de Jorge Sampaio. Se para o último Presidente da República oriundo do PS essa “ousadia” correu bem, Seguro também se permite olhar para esta contenda com a perspetiva de um Rúben Amorim: “E se corre bem?”
Opinião, por João Bastos