Quais são as necessidades básicas das crianças?

Saúde é um estado de bem-estar físico, mental e social.

Para que sejam saudáveis, todas as crianças precisam de viver num ambiente seguro e repleto de amor, onde possam comer bem, dormir bem e fazer exercício físico.

Uma alimentação saudável e diversificada é indispensável em todas as idades. Tem um papel particularmente importante na infância, altura em que carências ou excessos alimentares se podem converterem danos irreparáveis. Alguns erros alimentares presentes na infância (excesso de doces, gordura e sal, pouca quantidade de legumes e fruta, isenção ou excesso de proteínas) são facilmente adotados pelas crianças e têm tendência a perpetuar-se na vida adulta. A criança não compra nem confeciona os seus próprios alimentos, pelo que a supervisão dos adultos é fulcral na seleção da alimentação disponibilizada.

Dormir bem tem um efeito reparador cerebral indispensável. É imprescindível para o controlo das emoções, para a capacidade de concentração diurna, para o desenvolvimento cognitivo e para regulação do apetite, da imunidade, da pressão arterial e do crescimento. A sobrecarga de atividades ou a sua concentração no final do dia não pode comprometer a quantidade de horas de sono preconizada para cada idade. O uso de ecrãs não deve ser permitido na hora antes de dormir, porque a luminosidade interfere com a qualidade do sono. A quantidade e a qualidade do sono devem ser sistematicamente monitorizadas e orientadas pelos cuidadores.

O exercício físico combate o sedentarismo e desenvolve as capacidades físicas, cognitivas, mentais e sociais. Promove o contacto com a natureza, a coordenação motora e espacial, a motricidade fina e grosseira, o conhecimento dos limites físicos, a regulação das emoções, a aplicaçãode conhecimentos adquiridos e é, simultaneamente, antidepressivo. A jogar (“apanhada”, “escondidas”, “lutas”, etc.) a criança faz exercício físico, sob interação recíproca com os parceiros e adversários, o que lhe permite desenvolver capacidades de negociação com os pares. Na prática desportiva a criança/adolescente desenvolve as suas aptidões físicas, enquanto aprende a cooperar, a trabalhar sob pressão e a lidar com a frustração. Quando tem tempo livre a criança brinca por iniciativa própria, num processo lúdico e altamente criativo, que é fundamental para exercitar as suas capacidades físicas (sentar, gatinhar, andar, correr, pular, saltar, empoleirar-se, baloiçar, equilibrar-se, etc.), enquanto desenvolve a sua capacidade de adaptação a circunstâncias inesperadas. Brincar e jogar são modalidades indispensáveis em todas as idades, o desporto adquire maior relevância numa fase mais tardia da infância/adolescência. No horário diário de cada criança/adolescente o tempo livre nunca deve ser menosprezado. Brinquedos em excesso são dispensáveis, pois limitam a capacidade de concentração, assim como acriatividade.

Amor e disponibilidade constituem o pilar para uma interação recíproca entre pais e filhos. Nos primeiros anos de vida, esta interação é indispensável à aprendizagem da linguagem, da comunicação, da sociabilidade e da capacidadede concentração. Estas competências predispõem o cérebro para aprender a ler, escrever e pensar. Com o crescimento aumenta a autonomia. A disponibilidade familiar com regras representa “a ancora ao porto de abrigo”, o suporte seguro e insubstituível na transição para a vida adulta. A hiperestimulação cerebral a que a sociedade atual se encontra submetida, que, ingenuamente, acredita possuir um cérebro multitask, interrompe repetidamente a interação recíproca de qualidade. Esta não se compadece com a mãe que amamenta com um telemóvel, ou com a conversa/brincadeira interrompida pela notificação/ toque inesperado e inconveniente do telemóvel do pai/ mãe, ou com a televisão “de fundo” que, aparentemente, ninguém ouve à hora das refeições, ou com a família que janta no restaurante e em que cada um se debruça sobre o seu telemóvel. Somos seres sociais, vivemos em sociedade e o nosso cérebro só consegue realizar uma tarefa de cada vez. Os comportamentos antissociais apresentam impacto negativo e comprometem de forma irreversível a construção da arquitetura do cérebro em crescimento.

O desenvolvimento harmonioso não é compatível com o envolvimento da criança em guerras, discórdias ou conflitos desnecessários. Distúrbios dispensáveis de índole política, institucional, familiar ou pessoal podem gerar stress pós-traumático e ter repercussões na saúde mental. Contrariamente, o sofrimento familiar inevitável (a doença, a morte, as dificuldades económicas, as decisões difíceis, etc.) deve ser partilhado com a criança, de uma forma progressiva, sensata e natural. Isto permite-lhe confrontar-se gradualmente com o mundo real, proporcionando-lhe a maturidade desejável para enfrentar a transição progressiva da dependência absoluta ao nascimento para a independência real da vida adulta. Estabilidade, afeto e bom senso são alicerces fundamentais neste processo evolutivo.

Considerando que vivemos numa sociedade complexa, interligada e interdependente, é imprescindível que educadores, família alargada, entidades associativas e recreativas, associações de pais, autarquias, agrupamentos escolares, instituições governamentais e académicas envidem esforços convergentes na elaboração de políticas de saúde, de educação e de trabalho adequadas e construtivas. Esses objetivos devem contemplar a satisfação equilibrada de todas as necessidades básicas, uma vez que todas são imprescindíveis à saúde. Os horários sobrecarregados, habitualmente, comprometem o tempo de sono e o tempo livre para brincar.

No nosso concelho, a autarquia tem vindo a implementar inúmeras iniciativas que promovem a literacia em saúde, a estimulação precoce e a implementação de hábitos de vida saudável desde a mais tenra idade: alimentação saudável, redução do tempo de uso recreativo de ecrãs, melhoria das instalações escolares e implementação regular da prática desportiva são algumas delas. Apesar do progresso significativo, estamos cientes de que ainda há umlongo percurso a calcorrear, que depende de todos e de cada um de nós.

Teresa Gil Martins