Elisabete Veríssimo: “É preciso ter tempo e vontade de aprender a ter uma horta”

SACHÓNABO António Rodrigues, Elisabete Veríssimo e Rita Vicente decidiram que não queriam passar todo o tempo em casa. Por isso, arregaçaram as mangas e decidiram ter um pedaço de horta urbana. Em 2021, a iniciativa Sachonábo vai juntar 27 hortas às 169 disponibilizadas nas duas primeiras fases do projeto.

O projeto das Hortas Urbanas (Sachónabo) tem cerca de 10 anos de existência. Onde surgiu a decisão de querer um pedaço de horta urbana?
Elisabete Veríssimo (E.V): A decisão foi do meu pai. Ele sempre viveu num apartamento e com a reforma decidiu dedicar-se à horta. Como o espaço se tornou pequeno, aliciou-me para eu ter uma horta. Claro que acedi de imediato.
António Rodrigues (A.R): Eu moro quase ao pé das hortas. Estive nos bombeiros durante 37 anos, mas também trabalhei na agricultura. E na altura, gostava de ter uma horta que era para ao menos estar lá entretido. No verão, coloquei lá uma espécie de banquinhos para a gente estar lá e é muito mais fresco. Entretemo-nos ali com a horta e vamos tendo alguma coisa para a gente ir comendo.
Rita Vicente (R.V): A Câmara falou-me nisso. Disponibilizou aquele terreno e nós aproveitámos.

Conte-me a sua experiência na horta urbana? Que plantações faz lá?
E.V:
Vou ser sincera. Com o meu trabalho e com dois filhos, nem sempre é fácil, mas eu tento passar por lá para colher os produtos que a horta me dá. O meu pai planta e eu colho! Temos alfaces, feijão-verde, rúcula, tomates-cherry, batatas doces, cebolas, salsa, coentros, couves, morangos, curgetes, xuxu, etc… Nesta altura a hora está em grande força. Temos imensos produtos e quando temos a mais distribuímos pelos familiares e amigos.
A.R: Neste momento, eu tenho plantadona horta batata doce, feijão-verde, alface, tomates que agora estão bem grandes, favas, morangos, coentros e salsa. E também tenho lá plantado flores como rosas. Tenho de tudo um bocadinho (risos).
R.V: Eu planto lá feijão, batatas, cebolas… Tudo e mais alguma coisa! Eu também lá planto flores como rosas e gânglios.

António Rodrigues foi um dos primeiros almeirinenses a possuir um pedaço de horta urbana

Quais são vantagens de possuir uma horta?
E.V:
Consumimos produtos de excelente qualidade, sem produtos químicos e para o meu pai é o seu hobby. Todos os dias vai de bicicleta à horta e adora vir carregado de produtos (risos).
A.R: Em primeiro lugar, para mim, é que sabemos o que colhemos. Temos hortaliças e sabemos que os produtos não têm nada, não têm tratamentos nenhuns. Temos tudo o que a gente quer e dá para ter um bocadinho de cada coisa.
R.V: Apesar de gastarmos muito como em sementes para a plantação e o remédio para os caracóis e para as formigas, o estrume e o adubo, o que se torna uma desvantagem de ter uma horta, a vantagem é que nós sabemos o que comemos, porque não tem produtos químicos, é puro e fresco e é nosso. Ou seja, eu sei o que como. A horta, para mim e para a minha cabeça, é um remédio e um alívio. Por exemplo, eu vou para a horta e não tenho dores, eu não penso… É só ali naquilo! (risos). Eu gosto de estar a trabalhar na terra e adoro ver as coisas a crescerem.

Quando, por exemplo, colhe os legumes e frutas, e acaba por sobrar a mais, o que faz com eles?
R.V:
Dou aos vizinhos. Há muitos que pedem e eu dou. Também dou aos meus filhos e à família. Em relação às flores, Há muitos que pedem e eu dou. Também dou aos meus filhos e à família. Em relação às flores, eu dou a poucas pessoas. Só para aquelas que eu amo (risos).
A.R: No meu caso, as pessoas pedem e eu dou sem problemas. Pedem, a gente dá e eles ficam todos contentes.

Na sua opinião, porque é que este tipo de iniciativas é importante para a população do concelho de Almeirim?
E.V:
Promovem a agricultura de uma forma sustentável, dão espaço aos mais velhos para se manterem ativos. É uma forma de poupança, pois ficam com produtos da terra e é uma promoção de um estilo de vida mais saudável.
R.V: Porque eu acho que é uma população que vive de um verde rural e a maior parte das pessoas gostam deste ambiente de ter uma horta e poder passar lá tempo. E também estão lá hortas que estão desprezadas e se uma pessoa quiser arranjar mais que uma ou duas, é melhor do que estarem lá desprezadas cheias de erva e que ninguém toma conta delas.
A.R: Sim, elas de facto são importantes para o concelho. Porque as pessoas não ficam em casa. Na horta, vê-se alguma gente nova, mas a maioria das pessoas que passam mais tempo na horta são as mais velhas. As pessoas mais velhas passam lá quase o dia inteiro na horta a mexer a terra e a plantar lá umas coisas.

Rita Vicente também foi uma das primeiras almeirinenses a possuir um pedaço de horta urbana

Mas porque é que acha que essas hortas são desprezadas? É por causa da falta de tempo ou é porque as pessoas…
R.V:
Porque as pessoas pensam que aquilo é a brincar e que aquilo é só plantar, colher, e pronto. Tem de se tratar como deve de ser.

(…) as pessoas deviam de ter uma. E também acho que alguns deviam de ser sinceros, ou seja, que não devem apanhar em nome dos outros para terem mais hortas

António Rodrigues

Que mensagem gostaria de dar aos almeirinenses sobre esta iniciativa?
E.V:
A verdade é que é preciso ter tempo e vontade de aprender para se ter uma horta. Não é chegar, plantar e colher…
É preciso tempo e é por isso que nem todos conseguem manter as hortas. Algumas foram abandonadas e, neste momento, a Câmara Municipal de Almeirim está a fazer um levantamento das hortas abandonadas para estas serem entregues a um novo dono.
R.V: Que a população precisava de ter alguma coisa para se distrair, porque a horta é também uma distração. E se gostarem, para que ocupem o seu tempo a ter um bocadinho de terra e para não enlouquecerem por causa da pandemia.
A.R: Olhe, eu digo que as pessoas deviam de ter uma. E também digo que alguns deviam de ser sinceros, ou seja,
que não devem apanhar em nome dos outros para terem mais hortas. Neste momento, na parte mais velha da horta, que é onde eu estou, há pessoas que têm quatro ou cinco hortas, mas não estão em nome deles, mas sim de outras pessoas. É enganar quem está a mandar.

Horta de Elisabete Veríssimo

Ou seja, o que você está a dizer é que uma pessoa tem uma horta em seu nome, mas depois tem duas ou três hortas no nome de outras pessoas e vai colher a essas?
A.R:
Sim. Está em nome de outras pessoas que pedem para ficar nesses nomes. Eu, há dias, até disse à Dra. Ana Casebre se ela queria ir dar uma volta pelas hortas comigo para os lados que eu conheço.

Entrevista de Mariana Cortez
Fotografias de Ana Rita Amaro