À conversa com Madalena Nogueira, coordenadora da Unidade de Patologia Mamária do Hospital Distrital de Santarém, ficámos a conhecer de perto o trabalho desenvolvido na deteção precoce do cancro da mama e os desafios enfrentados pela equipa.
Como surgiu a ideia de organizar a Gala Musical Solidária “Outubro Rosa… Músicas que Inspiram”?
A gala surge porque nós, anualmente, nas comemorações do Outubro Rosa, tentamos passar informação sobre a necessidade de fazer o rastreio do cancro da mama, de forma a conseguirmos detetar os tumores em fases muito iniciais. A principal mensagem que queremos transmitir é: façam o rastreio! E aproveitamos este mês para motivar e também dar alguma informação às mulheres.
Por mais que se fale, não é o suficiente e temos ainda vários casos que chegam em fases muito avançadas que já não deveríamos ver. Trata-se, portanto, de um alerta.
Em vez de estarmos apenas a fazer palestras, que às vezes são um bocadinho aborrecidas, tentámos fazer uma coisa nova. Há dois anos fizemos um tipo de evento diferente e, este ano, lembrámo-nos de fazer uma gala e de pedir ao David Antunes e ao Emanuel Moura para virem atuar nesta iniciativa.
Temos um bilhete solidário, uma pequena quantia, para nos ajudar a comprar um equipamento que precisamos para a nossa prática cirúrgica, que tem um custo avultado. A ideia de fazer a gala em Almeirim surgiu porque andámos à procura de um sítio que pudesse receber um número significativo de pessoas e reparámos que não tínhamos muitos locais com essa capacidade.
A nossa primeira opção foi precisamente o Espaço Multiusos de Almeirim e, quando fomos falar com o presidente da Câmara Municipal, mostrou-se muito recetivo e disponibilizou-nos o espaço sem qualquer custo. Achamos que também é bom sair um bocadinho da cidade porque, na verdade, temos doentes de todas as partes do distrito e até de fora dele.
Qual foi a abertura dos artistas e como tem sido a recetividade da população a esta iniciativa?
Os artistas mostraram-se totalmente disponíveis, vão estar presentes de forma solidária. Da parte da população, temos tido alguma recetividade, estão efetivamente a comprar bilhetes, mas precisamos que venham muitos mais.
Temos divulgado muito nas redes sociais e aqui dentro do hospital. Fora deste contexto, temos pedido algum apoio à comunicação social. Trata-se de uma tarde de domingo, portanto é uma tarde bem passada, com alegria, porque também não podemos só pensar em tristeza quando se fala em cancro.
O que é que o público pode esperar desta tarde de solidariedade?
Para já, uma mensagem de reforço do alerta para fazerem o rastreio do cancro da mama. Depois, pensarmos que isto não é só um diagnóstico que nos é dado e que nos deixa tristes. Durante o processo, as mulheres passam por diversas fases, com momentos menos bons, mas, no fundo, também queremos dar algumas alegrias não só às senhoras que estão a passar pela situação, como àquelas que poderão vir a passar.
Que papel desempenha a Unidade de Patologia Mamária na prevenção e diagnóstico precoce do cancro da mama na região?
Nós aqui não fazemos a prevenção, porque isso é a Liga Portuguesa Contra o Cancro que faz. Nós recebemos as senhoras que vão à associação fazer o seu rastreio e, quando vem positivo, são encaminhadas para a nossa unidade. Aqui completamos o diagnóstico com mais exames para depois elaborarmos um plano terapêutico, seja ele cirúrgico ou não, de forma a começarmos a tratar a pessoa.
Quantos utentes, em média, são acompanhados anualmente pela unidade?
Nós avaliamos, essencialmente, o número de novos casos por ano. No ano passado, superámos os 200 e este ano vamos a caminho desse número também. Ao longo dos anos, esse número tem vindo a crescer e, na minha opinião, ainda vai crescer mais, porque as idades para realizar o rastreio foram alteradas. Antes era dos 50 aos 69 anos, agora é entre os 40 e os 75 anos, portanto, vão ser detetados mais casos, até porque o número de casos em pessoas mais novas está a aumentar.
Para terem uma noção, quando a unidade foi criada, começámos com 20 e tal, 30 casos por ano. Recebemos casos de muitos lados, não só do distrito, mas também de fora dele, porque ouvem falar de nós e sabem das inovações que vamos tendo. Posso considerar que somos uma unidade de referência e que estamos bem colocados a nível nacional.
Quais os principais desafios que enfrentam no dia a dia?
O nosso principal desafio passa por querermos, no menor espaço de tempo, fazer tudo. Ou seja, o ideal seria receber uma senhora, pedir os exames necessários e serem feitos rapidamente, para depois a tratarmos, de forma a termos um desfecho feliz. Embora a unidade tenha quatro cirurgiões, somos poucos. Não quer dizer que ultrapassemos os tempos que estão preconizados, mas gostaríamos de os reduzir ao máximo.
O dinheiro angariado será utilizado para que fim?
O equipamento que queremos adquirir tem um custo de 80 mil euros. Permite que, quando estamos a fazer as cirurgias, poupemos a mama: tiramos uns pedacinhos onde está o tumor e o tecido bom à volta. Esse tipo de cirurgia denomina-se tumorectomia e precisamos de saber se retiramos o tumor com tecido bom à volta em quantidade suficiente. Para isso, estamos dependentes da anatomia patológica, muitas vezes também da radiologia, e esse aparelho dá-nos tudo isso.
Em que medida este equipamento vai melhorar a capacidade de resposta e os cuidados prestados?
O objetivo deste aparelho é reduzir o número de intervenções nas mulheres. Aumentar a qualidade, mas reduzir o impacto. Em vez de estarmos a fazer segundas cirurgias para retirar mais um pouco de tecido porque não tirámos o suficiente, naquele dia sabemos se temos de retirar mais tecido e retiramos na hora, e não passados 15 dias ou três semanas. Isto porque o impacto destes procedimentos nas senhoras é muito grande a nível psicológico.
Que mensagem gostaria de deixar à população sobre a prevenção do cancro da mama?
Em primeiro lugar, quem está incluído no rastreio deve aderir. E quem detetar alguma alteração, mesmo que não esteja incluído no rastreio, deve recorrer ao médico de família ou ao ginecologista para ser encaminhado. Às vezes, aquilo que parece não ser importante pode ser uma alteração grave e deve ser avaliado.
O programa de rastreio está implementado e os centros de saúde costumam chamar as mulheres via carta registada. No entanto, muitas vezes, algumas senhoras recebem essa carta e não ligam ou ignoram. É fundamental que, ao receberem uma chamada ou marcação para o rastreio, compareçam. Cinco minutos que se dedicam ao rastreio podem significar muitos anos de vida. Faz toda a diferença!
As pessoas, por vezes, acreditam que tumores pequenos, detetados no rastreio, são sempre de bom prognóstico. Mas nem sempre é assim. Um tumor pequeno não significa, necessariamente, um bom prognóstico. Pode ser altamente agressivo. E existem tumores grandes, em tamanho, que são menos agressivos.
O problema é que, muitas vezes, esses tumores grandes já vêm de há anos, de pessoas que esconderam a situação até estar muito avançada, volumosa ou a sangrar. Isto acontece sobretudo com pessoas idosas, envergonhadas ou que não querem preocupar os filhos.
O nosso objetivo é evitar que isso aconteça. Queremos que as pessoas adiram ao rastreio, que compareçam quando são chamadas, porque isso pode salvá-las!